quarta-feira, julho 14, 2010

Adeus, sorriso metálico!

 
Em 15 dias, eu tiro esse delicioso aparelho. Meu sorriso metálico acompanhou as lágrimas de um fim de namoro, uma auto-estima abalada e diversos porres homéricos. Ele se despede de mim, agora que já estava acostumada, que já podia falar (direito) algumas palavras. Mesmo que estas fossem repetidas e bobas.

Na bagagem, o aparelho leva 2/3 do meu mau-humor, a minha raiva contida, aquela dor insuportável da terça-feira. Tenho dentes perfeitos. Lindos. Dão vontade de morder. Tantas horas deitada naquela divã disfarçado de cadeira de dentista, rendeu bons frutos.  Pode parecer filosofia cristã, mas meu íntimo companheiro certificou que depois da dor, vem à bonança.

Não foi fácil. Doeu pra caralho. Cheguei a cogitar que as dores, todas as que eu conhecia, eram absurdamente inferiores a essa dor específica que é endireitar os dentes. Acredite, um aparelho pode doer mais que um coração partido. Mesmo que este coração tenha sido destronado e picado em pedacinhos.

Muitas vezes, eu chorava em frente ao espelho, como uma adolescente de 17 anos. Entre apertos semanais e mensagens esperançosas, eu percorri esses 4 longos meses. Mas agora que tudo acabará em duas semanas. Pensei até em fazer uma camiseta com a seguinte frase: “Aftas, rasgos e pontas de metal - eu sobrevivi.” – para eternizar o momento. Seria uma poesia visual, para encorajar os medrosos.

Tenho que admitir: não terei saudade do meu apetrecho. Mesmo ficando mais jovem. Ou recebendo cantadas imaturas ao meu sorriso prateado. As pessoas puxavam assunto, contam seus dramas pessoais, quando tiveram seus próprios bichinhos metálicos. Ganhei alguns bons amigos, dei meu primeiro beijo. Imaginei que poderia até ser feliz, mesmo com a boca rasgada. Foi engraçado. Mas a minha juventude disfarçada não me fará falta.

O importante agora é que sem ele, eu volto a comer torresmo na feijoada, quebrar halls preto e tomar coca-cola. As alfaces não ficarão mais grudadas em todos os poros do meu aparelho. Toda a comida que era armazenada entre esses gentis quadradinhos de metal, irá para o lugar certo. Vou engordar 2 quilos felizes. Inclusive, declaro que depois da retirada do aparelho, entre uma garfada e outra, acrescentarei um sorriso largo e sincero, para todos os presentes no restaurante. E o melhor, novamente poderei escovar os dentes com o dedo indicador, caso seja necessário.

Como uma amante saudosa, a minha língua acariciará os dentes libertos. Por horas, os dois amantes irão dialogar e espalhar saliva, numa dança constante. O batom vermelho, antes esquecido, beijará a minha boca por 2 semanas consecutivas. Vou passá-lo até para dormir. Mesmo que suje o lençol, mesmo que eu acorde borrada. Minha felicidade será vermelha. Sem apertos, sem barulhos dentários.

Em 15 dias, eu volto a sorrir para os estranhos.

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