sábado, maio 26, 2012

Para os fios de cabelo

Triste é saber que tudo passa. Que em breve terei que reler cartas mofadas para tentar buscar aquele cheiro, aquele gemido. O timbre que parece continuar na cabeça, mas que na verdade, já se perdeu entre um orgulho e outro. Como é difícil caminhar passos tão semelhantes, mesmo que em caminhos diversos. A dor permanece traçada, incrustada na pele. Pouco importa o dia da semana ou o salário do mês. Solidão é está inapto dentro de uma cortina de fumaças. É não se misturar, não achar graça em quase nada. É a incompetência generalizada de saber sorrir. Todas as palavras se repetem. Sempre. As relações. O eu te amo. Nada disso me pertence de verdade. Somente o corte vertical bem no meio do corpo. Aberto de novo. Desnecessária. Rocha trincada. Distribuo as mentiras. O som do corpo que despenca. Corroída. Putrefata. Tudo é passagem, e pela falta de afeto, do desejo de estar presente, eu me descarto. Nada de muito importante, digo em voz alta. Tons apagados. Ou sépia - pela moda, pelo desgaste. Não me reciclo. Não mudo os conceitos. Opto pelo silêncio, pelo monólogo partido. Hoje, eu só declamo para os meus fios de cabelo. 

sexta-feira, maio 11, 2012


O profundo silêncio que se escuta. Eco de liberdade. Fios de cabelo no chão. Quantos cairão até o final do último parágrafo? Eu celebro o ato de descamar diariamente. Um pedaço de pele. Um pedaço de unha. Um pedaço de palavra. Esfrego a minha senhora, enquanto tomo banho. Retiro o cheiro dela, disfarço o gosto, camuflo o medo.  Eu entrego, sem objeções, o meu império. Os pés dançam sob o abismo velado a espera diária por uma solução eficaz. Eu bebo a minha eternidade no café da manhã. Assopro as certezas para longe. Peço para que em breve, não haja mais chão. Nem buracos. Nem padrões. O meu tempo deve ser todo consumido. Me despeço enquanto apago as memórias deixadas. Intercessões, alegrias, dores, marcas, as cicatrizes e afins. Os pormenores serão abortados. Até que tudo vire ausência. E o acaso me transforme em lembrança.