Duas
faixas perpendiculares. Elas, interceptadas, formam um ângulo reto. A geometria
usual, comercial de margarina. Pilar da propriedade. Com direito a herança,
benção do padre, olhares orgulhosos dos mais banais. No modelo almejado não há
espaço para outras intercessões. As ramificações ficam proibidas perante a
igreja e a sociedade. Digo, assim, a luz do dia. Demais linhas não devem
entrecortar o ângulo reto. Como o marco zero, aquele que abre espaço. Divide em
dois eixos. Quase sempre, são duas faixas que se cruzam. As paralelas não
contam. Mesmo podendo chegar a seis. Pouco importa o número. Elas não se
beijam.
...
Aqui
algo difere. São três vias. Elas se misturam. É difícil definir o ângulo. Não
há perpendiculares, teorias ou valores morais. Rasgaram o livro, a constituição.
Atrás das árvores, o triangulo, no meio, um círculo coberto de flores roxas. As
ruas se entrecruzam, diluídas. Luzes dançam em volta. E daqui de cima, os meus
olhos avistam a roda de fogo, no centro do trio. O todo que pulsa num espaço
específico. Espécie de bruxaria. Sem começo ou fim. Entremeios une as três
ruas. Parecem abdicar dos limites de reta para construir uma pequena utopia. Um
balão, bucólico, no centro do peito.
...
Lugar
novo. Sem calçada, asfalto, concreto. O balão voou. Não há paralelas ou
perpendiculares. O único caminho é o desejo. São os pés que transformam a
terra. É o corpo que suja o barro. A força motriz do acaso. Escuto o meu peito
recheado do agora. Um amor individual brota. A cidade está a beira. caminha-se
para dentro. Poder olhar pra si. Entender o ato de pisar sobre uma rota
improvisada. Ser a própria obra, criar a tua via.