domingo, junho 29, 2008

Ao Novo Chef


Antes de você começar, é preciso limpar a cozinha.
Deixar a geladeira vazia. Jogar o resto de comida fora.
Esquecer de todas as outras que foram embora.
Se deliciar com o momento presente.
Escolher com calma, cada ingrediente:
Açúcar, afeto, chocolate e ervas finas.
Sair por ai, à caça de boas meninas.
Deixar ser escolhido pela mais adocicada.
Aquela que parece meio doida, meio enluarada.
Ter um beijo roubado, um nome trocado, sorriso encabulado.
Depois cobrir a moça com o teu desejo sedento.
Ir adicionando água, farinha e fermento.
E amassar, amassar, amassar devagar.
Para que a massa cresça uniforme.
Sem pressa, sem medo, sem embolar.
Pensar direitinho com o que rechear:
Se quer doce, se quer amarga.
Se quer seca, se quer molhada.
Se quer rápida, se quer demorada.
Aquecer o forno, escolher o grau.
Esparramá-la em sua assadeira.
E após assar, decidir como servir:
Em pedaços ou inteira?
Ah, por favor, depois de jantar, lamba os beiços e lave as mãos!

quarta-feira, junho 25, 2008

Baile de Máscaras

Acenaram as mãos.
Sem intimidade.
Sem contato.
Sem cheiro.
Sem retrato.
Sem beijo.
Sem gemido.
Sem verdade.
Sem sentido.
Encenaram as mãos.

terça-feira, junho 24, 2008

Haiku

Espia a espera,
Espia como pia,
Espera da moça,
na cama vazia.

Definição

ave. vento. sorriso. excremento. dúvida. desejo. raiva. beijo. efêmera. independente. suspensa. carente. pisciana. lucia. sopro. sangue. água com gás. boba. infantil. madura demais. poeta. doce. atriz. amarga. amada. perdida. largada. encontrada. lágrimas e gemidos na madrugada.

Antítese do ser: sou eu, sou vc.

segunda-feira, junho 23, 2008

Poesia Gripada

Começa com aquela moleza no corpo.
Coisa dengosa, olhar perdido.
Será que eu vou de vez,
Ou será que dessa vez eu fico?

E de repente, me vejo tomada por ela.
Não há como fugir, ou me auto-enganar.
Sua voz rouca, seu jeito escorregadio.
Agora é só com essa dona que vou dançar.

Ela me leva direto pra cama.
não aceita minha negação.
me cobre de lenços de papel
E me beija a boca e o pulmão.

Chazinhos de gengibre.
Pastilhas de menta.
Resfenol de manhã.
Chocolate com pimenta.

Cof cof cof
Achitm achitm
Pra mim, já chega.
Dessas onomatopéias chinfrins!

Imploro que passe.
Aviste outro amor.
Sai desse corpo que não te pertence.
Moça vai embora, por favor!

quarta-feira, junho 18, 2008

Canalha

Acossado, de Jean-Luc Godard

"Beijei um canalha!" - ela disse de olhos fechados a si mesmo no meio da madrugada. Nem nomes, nem poemas, nem perfumes. Apenas um corpo desconhecido e descabelado que introduzia sem pudor aquele gosto específico nos seus lábios secos. O gosto característico de uma espécie rara, quase extinta no mundo atual. O gosto de um canalha perfeito. Digo desses autênticos. Rodriguianos. Convencionais. Escorregadios. Com a voz rouca, cara de carente e as mãos macias. Um canalha de marca maior... Num primeiro momento, além de surpresa com a descoberta, ela ficou extremamente excitada com a possibilidade de ser transportada para um novo lugar. Ou melhor, um antigo lugar. Um lugar preto e branco. Nouvelle Vague com banquinhos e música francesa ao fundo. Não que ela fosse romântica, ainda mais com ícone desses do seu lado, mas é que só conseguia imaginar tipos como esses nos filmes antigos. "Não é que canalhas existem?" pensou enquanto esboçava um sorriso no canto da boca. Não que ela fosse masoquista ou maluca. Pelo contrário, a constatação de que havia beijado o tal moço fazia dela, a mulher mais feliz do mundo naquela pista suada de sábado. Era como se ela tivesse dançando abraçada com a verdadeira identidade secreta masculina. O estereótipo que tinha sido alertada tantas vezes pela sua avó, pela vizinha fofoqueira, pelas revistas clichês. Ali, ao alcance das tuas mãos, um canalha! Bingo! Enfim, resposta certa! Nada mais de conversas doces, presentes doados ou um futuro delicadamente planejado. Mesmo porque, para os canalhas, o futuro não existe. O que existe é essa pista lotada, cheia de bocas e bundas, essa música gritando, a cerveja gelada no corpo quente. E cá pra nós, um homem desses, não engana ou assusta as mulheres. Talvez garotas. Mas não mulheres. "Eu tenho medo dos cordeiros, e não do lobo mau." - ela repetia nos dias de caçada. E o que é um canalha, senão um belo lobo mau? Ele escancara tua fome, pede cafuné e te garante uma noite deliciosa se você permitir. "Sim...Mil vezes sim..." - sussurrava ao pé do ouvido transformando seu canalha em presa. A música continuava alta, os corpos cansados dançavam e ela era engolida lentamente pelo seu par fora de moda. Carona, casa, quarto, cama, corpo, cansaço, canalha. “Qual era mesmo o nome dele? ”- ela tentava se lembrar, no dia seguinte, esbarrando com o sorriso apaixonado do moço ao lado, que insistia em dar mais um beijo depois de uma noite quente na cidade fria.
Meu amor, pra que esse grito,
se respondo muito melhor
com sussurro ao pé do ouvido?

sexta-feira, junho 13, 2008

Querer : Verbo transitivo - Verbo intransitivo - Substantivo masculino

Dialogar com seus olhos
Beijar seus cabelos
Teus pêlos nas minhas coxas
Você me deixando frouxa.

Tua barba na minha nuca
Teu gosto no meu umbigo
Teu som no meu ouvido

Quero muito mais,
Muito mais do que a gente tem sido.

Suspiro

Tira de Lucas Tonon Gehre

Alguma falta, muito desejO.

ou

Casaco vermelho, coração cinzA.

quinta-feira, junho 12, 2008

terça-feira, junho 10, 2008

Escorrega-dor


Tira de Lucas Tonon Gehre

Peço. Imploro. Suplico.
Apenas aprender a escorregar direito nessa vida...
Sentar no assento sem medo ou receio.
Talvez cair de bunda no chão no meio da contramão.
E ainda assim, conseguir ver o por do sol em seguida.

domingo, junho 08, 2008

Ação Necessária

Pausa ( s. f.) : Ato de ficar em silêncio, de preferência calma, madura e quentinha. Momento de ser só minha. Se deliciar com um brigadeiro de colher. Ver filme enroscada num edredom qualquer . Receber abraços dos livros favoritos. E escutar a voz do Arnaldo no pé do ouvido. Esquecer de você e namorar a solidão.